sexta-feira, 27 de março de 2009

Os Túmulos

Diz Fernão Lopes: “E sendo lembrado de honrar seus ossos, pois lhe ja mais fazer nom podia, mandou fazer um muymento de alva pedra, todo mui sutilraente lavrado, poendo-lhe enlevada sobre a tampa de cima a imagem della com coroa na cabeça, como se fora Rainha; e este muymento mandou poer no moesteiro de Alcobaça…”




Por desgraça nossa, os túmulos não chegaram intactos aos dias de hoje, tendo sofrido os primeiros estragos quando D. Sebastião fez abrir o de D. Pedro com o fim de censurar ao cadáver a sua fraqueza de amante. Depois, aquando da invasão francesa, os soldados saquearam os corpos, tendo para isso arrombado os túmulos.
É nos túmulos que se encontra toda a história de Inês, e a história por tal modo se emaranha na lenda que é impossível saber onde a história termina e onde a lenda começa.

Diz a lenda que, por desígnio de Dom Pedro, os túmulos foram colocados frente a frente para que, no dia do Juizo Final, ao acordarem da morte, os olhos de ambos logo se encontrassem.

Túmulo de D. Inês


D. Inês de Castro encontra-se rodeada de anjos e coroada de rainha. A mão direita toca na ponta do colar que lhe cai do peito e a mão esquerda, enluvada, segura a outra luva.

Os temas representados no túmulo são, nos frontais, a infância de Cristo e a Paixão de Cristo e, nos faciais, o Calvário e o Juízo Final.

Túmulo de D. Pedro I



D. Pedro I está representado também coroado e rodeado por anjos. Segura o punho da espada na mão direita, enquanto com a esquerda agarra a bainha.
Neste túmulo destaca-se o facial da cabeceira onde está representada a Roda da Vida e a Roda da Fortuna.


Num artigo publicado pela “Revista da Faculdade de Letras” – "A roda da Fortuna / Roda da Vida do Túmulo de D. Pedro, Em Alcobaça" -, C. A. Ferreira de Almeida considera a rosácea do túmulo de D. Pedro uma “preciosa fonte monumental para a história e cultura do seu tempo”.

Depois de lermos este artigo, considerámos a informação tão importante que nos pemitimos transcrevê-la:

“A rosácea do túmulo de D. Pedro mostra-nos, a partir de um nódulo circular, central, uma estrutura radial de seis grandes pétalas cujo remate é preenchido por moldura bilobada. No espaço de cada uma destas pétalas há uma cena, sempre com D. Pedro e D. Inês (…)





I – D. Pedro acaricia D. Inês que está sentada à sua esquerda, certamente porque ainda não estavam casados.

II – D. Inês senta-se à direita de D. Pedro, porque haviam casado. As mãos esquerdas uniam-se e apertavam-se sobre o peito de D. Pedro, conforme garante a sua direcção e a cicatriz da partição, simbolizando o seu casamento.

III – Sentados no mesmo banco, D. Pedro com espada e perna cruzada, numa atitude de nobre, preparavam-se para governar e ser felizes.

IV – D. Afonso IV tem D. Inês sentada à sua esquerda e, mostrando-nos a palma da mão direita e o dedo indicador da esquerda virado a D. Inês, indica-nos que lhe comunica uma resolução incriminatória.

V – D. Inês, tendo em atenção as atitudes e os vestígios das mãos, repele um homem com barba que tudo sugere ser D. Afonso IV, o qual se prosta a chorar com as mãos na cabeça.

VI – D. Inês e D. Pedro, prostrados no chão, um para cada lado, estão tragicamente subjugados pelas garras de um animal monstruoso de cujo costado emerge uma figura feminina que agarra uma parte do eixo da rosácea. (…)


A orla exterior da rosácea do túmulo de D. Pedro tem uma sequêscia de doze largos alvéolos, de remate trilobado, com outras tantas cenas (…)

1 – D. Inês, sentada, acalenta-se e tem no regaço o seu primeiro filho que entretanto morreu. Vê-se, nitidamente ao lado, uma lareira onde arde o fogo e se cozinha. (…)

2 – D. Inês e D. Pedro, já casados, convivem com os seus três filhos, afagando dois deles.

3 – D. Inês e D. Pedro jogam xadrês.

4 – D. Inês e D. Pedro mostram-se em doce convívio. Numa atitude nobre, D. Pedro tem uma perna cruzada.

5 – É uma cena difícil de ler. Parece que D. Inês subjuga uma figura, talvez de mulher, que está no chão.

6 – Magestático, de pernas abertas, D. Pedro reina. Como eixo semântico de qualquer roda da vida é o vertical, a esta cena opõe-se, no fundo, a de D. Pedro no túmulo.

7 – Ao que parece, vemos um conselheiro do reino calcando D. Inês. Levará na mão um rolo de legista.

8 – D. Inês reage e, nobremente, despreza e calca o mesmo conselheiro de D. Afonso IV.

9 – Figura da Justiça indica a sentença do conselho do rei: a degolação de D. Inês. (…)

10 – Algoz, sem barba e veste curta, executou D. Inês cuja cabeça, de belo rosto, jaz no chão.

11 – Dois algozes matam o conselheiro Pedro Coelho, de barba comprida, apunhalado pelo peito.

12 – D. Pedro jaz no seu túmulo até ao Juízo Final, conforme nos diz a inscrição, inspirada no símbolo dos Apóstoos: A(qui) E(spero) A FIN DO UM(n)DO.”

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